sábado, 10 de janeiro de 2015

Sexta-feira de Outono


Rosa parou diante da porta e mexendo na bolsa tirou a chave e abriu a porta. Ao entrar foi como se algo a empurrasse para aquele móvel da sala onde estava o porta-retratos, olhou-o e relutou em se aproximar pensando que já deveria ter se livrado daquela foto. Sem conseguir resistir chegou perto e começou a chorar. Era como se o choro estivesse alí presente o tempo todo e somente necessitasse de uma pequena, qualquer mínima razão para se manifestar em lágrimas. Passando o choro tirou os sapatos e deixou-os num canto da sala, indo a cozinha deu uma boa olhada no que havia disponível na geladeira para a janta, chegou a conclusão que macarrão era o mais rápido e fácil para uma pessoa só e de repente lembrou do purê de batatas com bife quase sagrado nas sextas-feiras a dois. 
Decidido a janta foi direto para o quarto tirando as roupas no caminho e jogou-as no sexto para roupas sujas n'algum canto do quarto. Deitou na cama e quase sucumbindo ao cansaço e deixando-se dormir sem banho e sem janta levantou num pulo e escolheu uma música dançante, o ritmo da canção deu novo ânimo e o corpo obedecendo a impulsos desconhecidos começou a balançar, quando viu estava totalmente envolvida pela dança. Rosa sorriu. Como as músicas fazem bem a alma. Tomou banho e agasalhou-se, fazia frio aquela noite de outono. Botou a água no fogo e um barulho intenso que entrava pela janela da sala deixou-a preocupada, pensando em como eram comuns os acidentes naquela avenida movimentada porém logo o barulho cessou e Rosa sentiu-se confortada por estar em casa. 
Feito o macarrão, encontrou uma garrafa de vinho pela metade escondida no fundo da geladeira e animou-se com tamanho requinte para uma sexta-feira a noite tão solitária. A música ainda rolava ao longe, no quarto. Dispensou a mesa e foi para o sofá como de costume. Ao terminar lavou as pouquíssimas louças e foi pro quarto, agora tocava um música lenta, pegou um livro na estante e tentando concentrar na leitura só conseguia ficar a toa viajando em pensamentos que insistiam em tomar toda a sua atenção e que pareciam não ter ordem, pois, pensava no dia de trabalho, no compromisso de amanhã e principalmente na proximidade da data em que tudo ocorrera. 
Chorou novamente com a canção que se iniciava, não dava para não lembrar. Levantou-se e desligou o som. Retomou a leitura. Quando o sono enfim se tornou mais excitante que a leitura, levantou-se e foi ao banheiro escovar os dente. Deitou-se e aconchegando-se na cama sentiu falta de algo como sempre. A lembrança lhe tirou o sono e ficou acordada no escuro com os fantasmas a rondar seus pensamentos. Depois de muito rolar na cama a brisa morna que entrava pelas frestas da janela do quarto embalou seus sonhos. 
No dia seguinte de pé logo cedo arrumou-se, tomou só um café e antes de sair sentiu um arrepio, lembrou-se como sempre se sentia ao ir ao cemitério, não conseguia evitar, mas respirou fundo e saiu.